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2 de abril de 2011

Conjecturas nada estáveis I



"[O materialista histórico] extrai da época uma vida determinada e, da obra composta durante essa vida, uma obra determinada. Seu método resulta em que na obra o conjunto da obra, no conjunto da obra a época e na época a totalidade do processo histórico são preservados e transcendidos" (BENJAMIN, 1987, p.231).

Para que se possa compreender uma determinada época, ao invés de se adotar uma perspectiva “historicista”, de fundamento positivista, convém ser mais adequada uma postura que privilegie as manifestações ideológicas de cada momento histórico, compreendendo as suas oposições, intersecções e contradições. As próprias manifestações ideológicas não são estanques, pois são ressignificadas às variáveis de tempo, espaço, condição socioeconômica, cultural, racial, de gênero, etc.

A soma de tais variáveis é o que permite o exercício do materialista histórico em compreender uma determinada realidade e as perspectivas ideológicas que estejam em jogo. Não esquecendo que ele próprio – o sujeito que se propõe a realizar o exercício de análise – a realiza sob uma perspectiva ideológica, seja consciente ou não, e que essa perspectiva não é harmônica, mas está em tensão com outras perspectivas ideológicas, hegemônicas ou emergentes em determinados campos sociais.

Tenho em vista, por exemplo, que, ao me propor a analisar a dimensão ideológica dos últimos textos de Marguerite Duras, publicados nos anos 90, devo considerar os posicionamentos que a sua escrita carrega – não diretamente, mas possivelmente como palimpsestos – frente a momentos históricos e vivências pessoais, como as políticas do império francês frente à colônia no oriente e o modo como tal circunstância histórica foi compreendida pela escritora a partir da sua vivência na infância, a sua participação na resistência francesa ao nazismo durante a segunda guerra e como essa experiência foi assimilada na sua escrita, bem como o engajamento e a decepção com o PCF, entre outras circunstâncias tematizadas diretamente ou tangencialmente pelo conjunto de sua obra.

Mas também devo ter em vista – embora não esteja entre os objetivos da pesquisa – as circunstâncias que fazem com que um jovem pesquisador em seus vinte e poucos anos, oriundo do sul do Brasil, através de várias experiências pessoais que fazem com que eu me constitua como sujeito de uma época e ao mesmo tempo singular, me interesse pelos textos de Marguerite Duras, e que sentidos são produzidos ao se ressignificar (pelo simples ato de leitura) uma obra produzida em diferentes circunstâncias históricas, geográficas, culturais, etc. Ou seja: devo ter em vista que o próprio discurso sobre outro discurso também traz consigo perspectivas ideológicas, seja em embate ou confluência entre si, ao mesmo tempo em que devo considerar que, inevitavelmente, todo o discurso se funda sob outros discursos.

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