Começo essa postagem considerando um desafio que meu cunhado me propôs: conhecer livros de José Sarney. E terminarei propondo um outro desafio a nós todos.
Sarney (PMDB-AP) não é senador pelo Maranhão. No Amapá ele consegue eleger-se senador com 152.486 votos, o que representa 53,87% dos votos válidos. A título de comparação, Passo Fundo – RS tem 183.300 habitantes (2007). Além de ser tudo isso que há mais de 50 anos todo mundo sabe que ele é (mas só agora o tucanato e demos descobriram, depois de apoiar a sua eleição para a presidência do senado, derrotando o candidato Tião Vianna do PT-AC. E quem é o suplente da vaga de Sarney na presidência, hein? Hein?), é o atual membro mais antigo da Academia Brasileira de Letras. José Sarney ingressou no universo literário com um livro de poemas em 1952. Também é autor de contos, crônicas, e romances, e foi eleito para a ABL em 1980.
Você já leu algum livro de Sarney? Eu confesso que ainda não. Mas lerei, respondendo ao desafio do meu cunhado e à minha curiosidade. Afinal, temos muitos nomes importantes na ABL hoje. Essa instituição apresenta-se, no artigo primeiro de seu estatuto como: "Art. 1º - A Academia Brasileira de Letras, com sede no Rio de Janeiro, tem por fim a cultura da língua e da literatura nacional, e funcionará de acordo com as normas estabelecidas em seu Regimento Interno" (ou será pôr fim?). Espero que, em caso de extinção da Academia (como previsto no artigo 9º) ainda possamos ter acesso a cultura de língua e literatura do Brasil. Porém, me chama mais atenção a respeito da ABL não são os Highlanders que por lá passaram (por favor, ninguém tente cortar a cabeça do Paulo Coelho!), mas justamente os que não passaram: ou é possível falar em Literatura Brasileira e não ter como referências à história da nossa cultura da língua e da literatura escritores como Lima Barreto, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Clarisse Lispector, Érico Veríssimo, Vinícius de Morais ou Mário Quintana? Que critérios afinal são esses para (como diria Olavo Bilac), separar os latoeiros dos ourives? Afinal: para que serve a Academia Brasileira de Letras? Para tomar chá?
Comecei o texto fazendo referência ao desafio do cunhado. Pois bem: entre divagações literárias, encontramo-nos julgando uma obra que não tínhamos lido. De fato, eu já havia despertado certa curiosidade pela literatura “sarneydiana”, mas ainda não tomei iniciativa alguma em ler os livros.
Mas, considerando a última novidade, como poderei (e poderão) culpar-me em divagar sobre livros que não li?
A novidade? Fernando Collor de Mello, ex-governador das Alagoas, ex-presidente da República e escorraçado do Planalto, atual senador pelas Alagoas (na vaga deixada por Heloísa Helena – Psol) e empresário da Organização Arnon de Mello (um dos maiores complexos na área das comunicações do Norte-Nordeste do Brasil, composta por Rádios, Emissora de TV, Jornal, instituto de pesquisa, entre outros. [...] As suas rádios são as mais ouvidas no estado, a sua Emissora Televisiva foi a primeira a transmitir em cores para Alagoas e seu jornal é o mais lido) é pleiteado a ingressar na Academia Alagoana de Letras. Sem concorrentes. E sem algum livro publicado.
A Academia Alagoana de Letras existe desde 1919. Assim como a ABL, tem 40 cadeiras, que homenageiam ilustres alagoanos falecidos. No site da AAL senti falta de alguma lista que fizesse referência aos que são e já pertenceram a essa Academia. Obriguei-me a recorrer à Wikipédia, para descobrir que nomes ilustres a comporem a história da AAL passam por Lêdo Ivo e Aurélio Buarque de Hollanda Ferreira. Mas não consegui dados suficientes para saber se Jorge de Lima, Graciliano Ramos, Djavan ou Zagallo também fizeram parte da Academia Alagoana. E agora querem que Collor entre para a nata dos ourives das letras alagoanas. Sem concorrentes. E sem algum livro publicado.
Não sei se o estatuto da AAL segue o modelo da ABL. Mas, no estatuto da Academia Brasileira encontramos o seguinte artigo: "Art. 2º - Só podem ser membros efetivos da Academia os brasileiros que tenham, em qualquer dos gêneros de literatura, publicado obras de reconhecido mérito ou, fora desses gêneros, livro de valor literário. As mesmas condições, menos a de nacionalidade, exigem-se para os membros correspondentes." As questões de valor literário e reconhecido mérito devem ser deixadas, ao menos por enquanto, de lado. Mas e a publicação de "qualquer dos gêneros da literatura"? Lógico que cabe a pergunta cabal: o que é literatura? E que conceito as Academias Brasileira e Alagoana de Letras utilizam?
Por exemplo: Getúlio Vargas foi membro da Academia tendo publicado apenas discursos. A bibliografia de Santos Dumont nem consta no site da ABL. Roberto Marinho publicou "Uma trajetória liberal" em 1992, e foi empossado na ABL em 1993. Se a regra é não ter regra, nenhum problema em Fernando Collor ingressar na AAL.
Diz Ivan Barros - escritor, jornalista e imortal - ao Tribuna do Sertão: “Ele [Collor] pode ter concorrente, alguns colegas acadêmicos podem receber pressões, mas a verdade é que tem dotes intelectuais de grande valia. Sua pretensão é modesta: apenas conviver mais intensamente com os amigos acadêmicos, razão pela qual não hesitarei em dar o meu voto e apoio. Depois a Academia Alagoana de Letras, que tem como presidente Fernando Iório (grande amigo de Collor), não pode privar-se de um homem de grande valor. Depois disso, Collor está ligado a Academia Alagoana pelo coração e pelo espírito. Seu pai, Arnon pertenceu aos quadros da Academia”. Segundo a IstoÉ, também o poeta Lêdo Ivo, membro da Academia Brasileira de Letras, (ABL) defende a imortalidade de Collor: "Ele preenche as condições. É autor de vários discursos, vai lançar um livro. Espero que entre, depois, para a ABL", disse.
Para se candidatar à almejada vaga de imortal da AAL, Fernando Collor teria apresentado uma coletânea dos seus discursos e artigos sobre os mais variados temas, e a pretensão de publicar "A crônica de um golpe", que retratará a sua visão sobre o processo de impeachtment. Pois é. Se ao menos esperassem ele publicar o tal livro. Nem precisariam ler, haja vista a situação; mas não seria tão escrachado. Fica agora o desafio que proponho: lermos a famigerada literatura do imortal Fernando Collor.
Agradecimento Post-Scriptum: para essa postagem tive a colaboração do amigo Crazy Water do Interior.
Comecei o texto fazendo referência ao desafio do cunhado. Pois bem: entre divagações literárias, encontramo-nos julgando uma obra que não tínhamos lido. De fato, eu já havia despertado certa curiosidade pela literatura “sarneydiana”, mas ainda não tomei iniciativa alguma em ler os livros.
Mas, considerando a última novidade, como poderei (e poderão) culpar-me em divagar sobre livros que não li?
A novidade? Fernando Collor de Mello, ex-governador das Alagoas, ex-presidente da República e escorraçado do Planalto, atual senador pelas Alagoas (na vaga deixada por Heloísa Helena – Psol) e empresário da Organização Arnon de Mello (um dos maiores complexos na área das comunicações do Norte-Nordeste do Brasil, composta por Rádios, Emissora de TV, Jornal, instituto de pesquisa, entre outros. [...] As suas rádios são as mais ouvidas no estado, a sua Emissora Televisiva foi a primeira a transmitir em cores para Alagoas e seu jornal é o mais lido) é pleiteado a ingressar na Academia Alagoana de Letras. Sem concorrentes. E sem algum livro publicado.
A Academia Alagoana de Letras existe desde 1919. Assim como a ABL, tem 40 cadeiras, que homenageiam ilustres alagoanos falecidos. No site da AAL senti falta de alguma lista que fizesse referência aos que são e já pertenceram a essa Academia. Obriguei-me a recorrer à Wikipédia, para descobrir que nomes ilustres a comporem a história da AAL passam por Lêdo Ivo e Aurélio Buarque de Hollanda Ferreira. Mas não consegui dados suficientes para saber se Jorge de Lima, Graciliano Ramos, Djavan ou Zagallo também fizeram parte da Academia Alagoana. E agora querem que Collor entre para a nata dos ourives das letras alagoanas. Sem concorrentes. E sem algum livro publicado.
Por exemplo: Getúlio Vargas foi membro da Academia tendo publicado apenas discursos. A bibliografia de Santos Dumont nem consta no site da ABL. Roberto Marinho publicou "Uma trajetória liberal" em 1992, e foi empossado na ABL em 1993. Se a regra é não ter regra, nenhum problema em Fernando Collor ingressar na AAL.
Diz Ivan Barros - escritor, jornalista e imortal - ao Tribuna do Sertão: “Ele [Collor] pode ter concorrente, alguns colegas acadêmicos podem receber pressões, mas a verdade é que tem dotes intelectuais de grande valia. Sua pretensão é modesta: apenas conviver mais intensamente com os amigos acadêmicos, razão pela qual não hesitarei em dar o meu voto e apoio. Depois a Academia Alagoana de Letras, que tem como presidente Fernando Iório (grande amigo de Collor), não pode privar-se de um homem de grande valor. Depois disso, Collor está ligado a Academia Alagoana pelo coração e pelo espírito. Seu pai, Arnon pertenceu aos quadros da Academia”. Segundo a IstoÉ, também o poeta Lêdo Ivo, membro da Academia Brasileira de Letras, (ABL) defende a imortalidade de Collor: "Ele preenche as condições. É autor de vários discursos, vai lançar um livro. Espero que entre, depois, para a ABL", disse.
Para se candidatar à almejada vaga de imortal da AAL, Fernando Collor teria apresentado uma coletânea dos seus discursos e artigos sobre os mais variados temas, e a pretensão de publicar "A crônica de um golpe", que retratará a sua visão sobre o processo de impeachtment. Pois é. Se ao menos esperassem ele publicar o tal livro. Nem precisariam ler, haja vista a situação; mas não seria tão escrachado. Fica agora o desafio que proponho: lermos a famigerada literatura do imortal Fernando Collor.
Agradecimento Post-Scriptum: para essa postagem tive a colaboração do amigo Crazy Water do Interior.
4 comentários:
Báh... Realmente este texto abre um debate amplo sobre a sociedade brasileira, partindo do caso Sarney. Interessante ver como vão se reproduzindo a "nata" da sociedade, esta mesma que com suas influencias lutam para manter o conservadorismo medíocre que venda olhos para as mudanças necessárias em suas regioes e país.
Quem diria... Elitismo cultural sadio?
desde a ABL até AVL (acadêmia vitoriense de letras, da minha cidade, Vit. De santo Antão-PE) que as cadeiras, são ocupadas, por interesses políticos, em sua maioria, bem fez Graça Aranha, e isso em um tempo em que a ABL era séria (ou mais ou menos), não aceitando a indicação, para ocupar um cadeira.
E sobre livros do Sarney, eu tb não li, mas tive péssimas recomendações do Livro: Maribondos de fogo, que dizem que é o melhor dele, efim...
parabéns pelo blog, gostei bastante, amanhã com mais calma, passo dinovo aqui, para dar uma lida...um abraço..
e se possível faz uma visita ao meu blog..
Texto instigador. Tentarei ler algum livro de Sarney (por ironia, acabei de recusar o convite da minha esposa para participar de uma passeata cujo lema é "Fora Sarney").
Abraço!!
Eis a questão: "Fora Sarney"? Que ele é raposa velha da política, isso há tempos todos sabemos. No entanto, qualquer movimento abstrato e sem proposta clara se torna vazio. Tem dois textos muito legais que analisam essa situação política:
1 - http://deputadoflaviodino.blogspot.com/2009/07/recebi-da-minha-amiga-e-companheira.html
Esse texto aborda o problema em aceitar campanhas genéricas: é necessário defender sim um projeto consistente de mudança.
2 - http://www.rodrigovianna.com.br/plenos-poderes/udn-psd-e-ptb-com-outros-nomes-eles-sobrevivem-e-disputam-o-poder-no-brasil
Esse outro texto compara a situação política no Brasil atual com o pré-64. De certa forma, é como se fosse necessário o governo Lula retornar ao ponto em que Jango parou.
E o que a ABL ou a arte tem a ver com isso? Justamente o estatuto de "arte" passa pelas instituições que aprovam ou reprovam as obras. E vale lembrar que está em jogo é o "reconhecimento social", e nem sempre o tão defendido valor desinteressado da arte.
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